Quando
chegou o tempo da circuncisão, isto é, o oitavo dia, época na qual o
recém-nascido deve ser circuncidado segundo a lei, eles o circuncidaram
na caverna, e a velha anciã recolheu o prepúcio e colocou-o em um vaso
de alabastro cheio de óleo de nardo velho. Como tivesse um filho que
comercializava perfumes, Maria deu-lhe o vaso, dizendo: "Muito cuidado
para não vender este vaso cheio de perfume de nardo, mesmo que te
ofereçam trezentos dinares". E este é o vaso que Maria, a pecadora,
comprou e que ela derramou sobre a cabeça e sobre os pés de Nosso Senhor
Jesus Cristo, enxugando-os com seus cabelos. Quando dez dias se haviam
passado, eles levaram a criança para Jerusalém, e, ao término da
quarentena, eles o apresentaram no templo, ao Senhor, oferecendo por ele
as oferendas prescritas pela lei de, Moisés, que diz: “Toda criança do
sexo masculino que sair de sua mãe será chamada O santo de Deus”.
O velho
Simeão viu o menino Jesus resplandecente de claridade como um facho de
luz, quando a Virgem Maria, cheia de alegrias, entrou com ele em seus
braços. E uma multidão de anjos rodeava-o, louvando-o e acompanhando-o,
assim como os satélites de honra seguem seu rei. Simeão, pois,
aproximando-se rapidamente de Maria e estendendo suas mãos para ela,
disse ao Senhor Jesus: II Agora, Senhor, teu servo pode retirar-se em
paz, segundo tua promessa, pois meus olhos viram tua misericórdia e o
que preparaste para a salvação que todas as nações; luz de todos os
povos e a glória de teu povo de Israel". A profetisa Ana também estava
presente, e ela rendia graças a Deus, e celebrava a felicidade de Maria.
E eis o que
aconteceu enquanto o Senhor vinha ao mundo em Belém, cidade da Judéia,
no tempo do rei Herodes: magos vieram de países do Oriente a Jerusalém,
tal como havia predito Zoroastro, e traziam com eles presentes, ouro,
incenso e mirra, e adoraram a criança, e renderam-lhe homenagem com seus
presentes. Então Maria pegou uma das faixas nas quais a criança estava
envolvida e deu-a aos magos que receberam-na como uma dádiva de valor
inestimável. E nesta mesma hora, apareceu-lhes um anjo sob a forma de
uma estrela que já lhes havia servido de guia, e eles partiram, seguindo
sua luz, até que estivessem de volta a sua pátria.
Os reis e
os príncipes apressaram-se em se reunir em torno dos magos,
perguntando-lhes o que haviam visto e o que haviam feito, como haviam
ido e como haviam voltado, e que companheiros eles haviam tido então
durante a viagem. Os magos mostraram-lhes a faixa que Maria lhes havia
dado; em seguida, eles celebraram uma festa, acenderam o fogo segundo
seus costumes, e adoraram a faixa, e a jogaram nas chamas, e as chamas
envolveram-na. Ao apagar-se o fogo, eles retiraram o pano e viram que as
chamas não haviam deixado sobre ele nenhum vestígio. Eles se puseram
então a beijá-lo e a colocá-lo sobre suas cabeças e sobre seus olhos,
dizendo: "Eis certa-mente a verdade! Qual é pois o preço deste objeto
que o fogo não pode nem consumir nem danificar?" E pegando-o,
depositaram-no com grande veneração entre seus tesouros.
Herodes,
vendo que os magos não retomavam a visitá-lo, reuniu os sacerdotes e os
doutores e disse-lhes: "Mostrai-me onde deve nascer o Cristo."E quando
responderam que era em Belém, cidade da Judéia, Herodes pôs-se a tramar,
em seu espírito, o assassinato do Senhor Jesus. Então um anjo apareceu a
José durante o sono e disse-lhe: "Levanta-te, pega a criança e sua mãe,
e foge para o Egito". E quando o galo cantou, José levantou-se e
partiu.
E enquanto
ele refletia sobre o caminho que ele devia seguir, a aurora o
surpreendeu: a correia da sela se havia rompido ao se aproximarem de uma
grande cidade, onde havia um ídolo ao qual os outros ídolos e
divindades do Egito rendiam homenagem e ofereciam presentes; sempre —
que Satanás falava pela boca do ídolo, os sacerdotes relatavam o que ele
dizia aos habitantes do Egito e de suas margens. Ora, este sacerdote
tinha um filho de três anos que estava possuído por um grande número de
demônios; ele profetizava e anunciava muitas coisas, e quando os
demônios se apossavam dele, rasgavam suas roupas e ele corria nu pela
cidade, jogando pedras nos homens. A hospedaria desta cidade ficava
perto deste ídolo; quando José e Maria lá chegaram e se hospedaram, os
habitantes ficaram profunda-mente perturbados, e todos os príncipes e
sacerdotes dos ídolos se reuniram ao redor deste ídolo, perguntando-lhe:
"Donde vem essa agitação universal, e qual é a causa deste pavor que se
apoderou de nosso país?" E o ídolo respondeu: "Esse assombro foi
trazido por um Deus desconhecido que é o Deus verdadeiro, e ninguém a
não ser ele é digno das honras divinas, pois ele é o verdadeiro Filho de
Deus. A sua aproximação, esta região tremeu; ela se emocionou e se
assombrou, e nós sentimos um grande temor por causa do seu poder". E
neste momento este ídolo caiu e quebrou-se, tal como os outros ídolos
que estavam no país, e sua queda fez acorrerem todos os habitantes do
Egito.
Mas o filho
do sacerdote, acometido do mal que o afligia, entrou no albergue
insultando José e Maria, dos quais os outros haviam fugido, e como Maria
havia lavado as fraldas do Senhor Jesus e as estendera sobre umas
madeiras, o menino possuído pegou uma das fraldas e colocou-a sobre sua
cabeça. Imediatamente os demônios fugiram, saindo pela sua boca, e foram
vistos sob a forma de corvos e serpentes. O menino foi curado
instantaneamente pelo poder de Jesus Cristo, e ele se pôs a louvar o
Senhor que o havia libertado e rendeu-lhe mil ações de graça. E quando
seu pai viu que ele havia recobrado a saúde, exclamou, admirado: "Meu
filho, mas o que te aconteceu, e como foste tu curado?" E o filho
respondeu: "No momento em que me atormentavam, eu entrei na hospedaria e
lá encontrei uma mulher de grande beleza que estava com uma criança, e
ela estendia sobre umas madeiras as fraldas que acabara de lavar; eu
peguei uma delas e coloquei-a sobre minha cabeça e os demônios fugiram
imediatamente e me abandonaram". O pai, cheio de alegria, exclamou: "Meu
filho, é possível que essa criança seja o Filho do Deus vivo que criou o
céu e a terra, e, assim que passou perto de nós, o ídolo partiu-se e os
simulacros de todos os nossos deuses caíram, e uma força superior à
deles destruiu-os".
Assim se
cumpriu a profecia que diz: "Chamei o meu filho do Egito" (I). Quando
José e Maria souberam que este ídolo se havia quebrado, foram tomados de
medo e de espanto, e diziam: "Quando estávamos na terra de Israel,
Herodes queria que Jesus morresse e, com esta intenção, ele ordenou o
massacre de todas as crianças de Belém e das vizinhanças, e é de se
temer que os egípcios nos queimem vivos, se eles souberem que este ídolo
caiu".
Eles então
partiram e passaram nas proximidades do covil de ladrões que despojavam
de suas roupas e pertences os viajantes que por ali passavam e, após
tê-los amarrado, os arrastavam pelo deserto. Estes ladrões ouviram um
forte ruído, semelhante ao do rei que sai de sua capital ao som dos
instrumentos musicais, escoltado por grande exército e por uma numerosa
cavalaria; apavorados, então, deixaram ali "todo o seu saque e
apressaram-se em fugir. Os cativos, levantando-se, cortaram as cordas
que os prendiam e, tendo retomado sua bagagem, iam retirar-se quando
viram José e Maria que se aproximavam e perguntaram-lhes: "Onde está
este rei cujo cortejo, com seu barulho, assustou os ladrões a ponto de
eles terem fugido e nos libertado?" E José respondeu: "Ele nos segue".
Chegaram em
seguida em outra cidade onde havia uma mulher endemoninhada, e quando
ela ia buscar água no poço durante a noite o espírito rebelde e impuro
apossava-se dela. Ela não podia suportar nenhuma roupa, nem morar em uma
casa, e todas as vezes que a amarravam com cordas ou correntes, ela as
partia e fugia nua para locais desertos; e ficava nas estradas e perto
de sepulturas, e perseguia, apedrejando, aqueles que encontrava no
caminho, de forma que ela era, para seus pais, motivo de luto. Maria
viu-a e foi tomada de compaixão, e imediata-mente Satanás a deixou e
fugiu sob a forma de um jovem rapaz, dizendo: "Infeliz de mim, por tua
causa, Maria, e por causa de teu filho!" Quando esta mulher foi
libertada da causa de seu tormento, olhou ao seu redor e corando por sua
nudez procurou seus pais, evitando encontrar as pessoas; após haver
vestido suas roupas, ela contou ao seu pai e aos seus o que lhe havia
acontecido. Como eles fizessem parte dos habitantes mais distintos da
cidade, hospedaram em sua casa José e Maria, demonstrando por eles um
grande respeito.
No dia
seguinte, José e Maria prosseguiram sua viagem, e à noite chegaram a uma
cidade onde estava sendo celebrado um casamento; mas, em decorrência
das ciladas do espírito maligno e dos encanta-mentos de alguns
feiticeiros, a esposa ficara muda, de forma que ela não podia mais
falar. Quando Maria entrou na cidade trazendo nos braços o filho, o
Senhor Jesus, aquela que havia perdido o uso da palavra avistou-o e
imediatamente pegou-o em seus braços, abraçou-o e apertou-o junto ao seu
seio e cobriu-o de carinho. Imediatamente o laço que travava sua língua
partiu-se e seus ouvidos se abriram, e ela começou a glorificar e a
agradecer a Deus que a havia curado. E houve naquela noite uma grande
alegria entre os habitantes desta cidade, pois acreditavam todos que
Deus e seus anjos haviam descido no meio deles.
José e
Maria passaram três dias nesse lugar, onde foram recebidos com grande
veneração e esplendidamente tratados. Munidos de provisões para a
viagem, partiram dali e chegaram em uma outra cidade. Como ela era
próspera e seus habitantes tinham boa reputação, eles pernoitaram lá.
Ora, havia nesta cidade uma boa mulher, e um dia em que ela havia
descido até o rio para lavar-se, eis que o espírito mal-dito, assumindo a
forma de uma serpente, se havia jogado sobre ela e cingido o seu
ventre; e todas as noites estendia-se sobre ela. Ora, quando esta mulher
viu Maria e o Senhor Jesus que ela trazia contra o seu seio, rogou à
Santa Virgem que lhe permitisse segurar e beijar a criança. Maria
consentiu, e assim que a mulher tocou a criança, Satanás abandonou-a e
fugiu, e desde então ela não mais o viu. Todos os vizinhos louvaram o
Senhor e a mulher recompensou-os com grande generosidade.
No dia
seguinte, esta mesma mulher preparou água perfumada para lavar o menino
Jesus e após o haver lavado, guardou esta água. E havia lá uma jovem
cujo corpo estava coberto pela lepra branca; lavou-se ela com esta água e
foi imediatamente curada. O povo dizia então: "Não resta dúvida de que
José e Maria e esta criança sejam Deuses, pois eles não podem ser
simples mortais". Quando eles se preparavam para partir, esta jovem que
havia sido curada da lepra aproximou-se deles e rogou-lhes que lhe
permitissem acompanhá-los.
Eles
consentiram e ela se foi com eles; chegaram a uma cidade onde havia o
castelo de um poderoso príncipe; foram até lá e se hospedaram nele. A
jovem, aproximando-se da esposa do príncipe, encontrou-a triste, a
chorar; então, perguntou-lhe qual a causa daquele pesar. E ela
respondeu-lhe: "Não te espantes de me ver entregue à aflição; estou em
meio a uma grande calamidade, que eu não ouso contar a ninguém". A jovem
tornou: "Se me confessares qual é teu mal, talvez encontres remédio
junto a mim". A esposa do príncipe disse-lhe: "Não revelarás este
segredo a ninguém. Casei-me com um príncipe cujo império, semelhante a
um império de um rei,estende-se por vastos estados, e, após haver vivido
por muito tempo com ele, ele não teve de mim nenhum descendente.
Finalmente, eu concebi, mas trouxe ao mundo uma criança leprosa; após
havê-lo visto, ele não quis reconhecê-lo como seu filho, e me disse:
`Mata esta criança ou entrega-a a uma ama que a crie num local tão
afastado que jamais voltemos a ouvir dela. E pega o que é teu, pois não
te verei nunca mais'. Eis porque me entrego à dor, deplorando a
calamidade que sobre mim se abateu, e choro por meu marido e por meu
filho". A jovem respondeu-lhe: "Pois não te disse que eu tenho para ti o
remédio que te havia prometido? Eu também fui atingida pela lepra, mas
fui curada por uma graça de Deus, que é Jesus, o filho de Maria". A
mulher perguntou-lhe então onde estava este Deus do qual ela falava. A
jovem respondeu-lhe: "Ele está bem aqui, nesta casa." Perguntou a
princesa: "Como pode ser isso, onde está ele?". A jovem respondeu: "Aqui
estão José e Maria, e a criança que está com eles é Jesus, e foi ele
quem me curou dos meus sofrimentos". "E por que meio, disse a mulher,
pode ele te curar? Não vais me contar?" A jovem respondeu: "Recebi de
sua mãe a água na qual ele havia sido lavado, e espalhei-a então sobre
meu corpo, e minha lepra desapareceu". A esposa do príncipe ergueu-se
então e recebeu José e Maria, e preparou para José um magnífico festim,
para o qual muitas pessoas foram convidadas. No dia seguinte, ela pegou
água perfumada a fim de lavar o Senhor Jesus, e ela lavou com esta mesma
água o seu filho, que ela havia trazido consigo, e logo ele se curou da
lepra. Então, ela pôs-se a cantar louvores a Deus e a render-lhe
graças, dizendo-lhe: "Feliz da mãe que te gerou, ó Jesus! A água com a
qual o teu corpo foi lavado cura os homens que têm tua natureza." Ela
ofereceu presentes a Maria e dela despediu-se, tratando-a com grande
deferência.
Em seguida,
chegaram a outra cidade onde deviam pernoitar. Foram à casa de um homem
recém-casado mas que, atingido por um malefício, não podia desfrutar
sua esposa; mas após haverem eles passado a noite perto do homem, o
encantamento quebrou-se. Quando o dia amanheceu, preparavam-se para
prosseguir a viagem, porém, o esposo impediu-os de partir e
preparou-lhes um grande banquete.
No dia
seguinte partiram, e ao se aproximarem de uma outra cidade, viram três
mulheres que se afastavam de um túmulo, a verter muitas lágrimas. Maria,
tendo-as visto, disse à jovem que os acompanhava "Pergunta-lhes quem
são elas e qual a desgraça que se lhes abateu".
Elas não
responderam mas puseram-se a interrogá-la dizendo: "Quem sois vós, e
para onde ides? Pois o dia está terminando e a noite se aproxima". E a
moça respondeu: "Somos viajantes e procuramos uma hospedaria para passar
a noite". As mulheres responderam: "Acompanhai-nos e passai a noite em
nossa casa." Eles seguiram portanto essas mulheres, e foram levados a
uma casa nova, ornada e decorada por diversos móveis. Ora, era inverno, e
a jovem moça, tendo entrado no quarto destas mulheres, encontrou-as
ainda chorando e se lamentando. Ao lado delas, coberta por uma manta de
seda, encontrava-se um mulo com forragem à sua frente. E elas davam-lhe
de comer e o beijavam. A jovem disse então: "O minha senhora, como é
belo este mulo!" ao que elas responderam chorando: "Este mulo que estás
vendo é nosso irmão que nasceu de nossa mãe. Nosso pai deixou-nos com
sua morte grandes riquezas, e nós só tínhamos este irmão, para quem
tentávamos encontrar um casamento conveniente. Porém, mulheres dominadas
pelo espírito da inveja, lançaram sobre ele, sem que soubéssemos,
encantamentos. E uma certa noite, um pouco antes do amanhecer, estando
fechadas as portas da nossa casa, encontramos nosso irmão transformado
em mulo, tal qual o vês hoje. Entregamo-nos à tristeza, visto que não
tínhamos mais nosso pai para consolar-nos; consultamos todos os sábios
do mundo, todos os magos, os feiticeiros, tentamos de tudo, mas nenhum
deles nada pôde fazer por nós. Eis porque sempre que nosso coração está a
ponto de explodir de tristeza, nós nos levantamos e vamos junto com a
nossa mãe que aqui está, ao túmulo de meu pai e, após haver chorado,
retornamos para cá.
Ao ouvir tais coisas, a jovem disse: "Tende coragem e parai de chorar, pois a cura de vossos males está próxima, está convosco muito próxima, em vossa morada; eu era leprosa, mas após haver visto esta mulher e a criança que está com ela e que se chama Jesus, e após haver derramado sobre meu corpo a água com a qual a sua mãe o havia lavado, eu me curei. Eu sei que ele pode pôr um fim à vossa desgraça; levantai-vos, aproximai-vos de Maria, conduzi-o aos vossos aposentos, e então revelai-lhe o segredo que acabais de me contar, e suplicai-lhe piedade". Ao ouvirem tais palavras proferidas pela jovem, elas se apressaram em ter com Maria, e o levaram até o quarto e lhe disseram, chorando: "Maria, Nossa Senhora, tem compaixão de tuas servas, pois nossa família está desprovida de seu chefe e não temos um pai ou um irmão que nos proteja. Este mulo que aqui vês é nosso irmão, e algumas mulheres, com seus encanta-mentos, reduziram-no a este estado. Rogamos-te, pois, que tenhas piedade de nós". Então Maria, comovida e chorando como as mulheres, ergueu o menino Jesus e colocou-o sobre o dorso do mulo, dizendo: "Meu filho, cura este mulo através do teu grande poder e faze com que este homem recobre a razão, da qual foi privado". Nem bem estas palavras haviam saído dos lábios de Maria e o mulo já havia retomado a forma humana. E mostrou-se sob os traços de um belo rapaz, e não lhe restava nenhuma deformidade. E ele e sua mãe e suas irmãs adoraram Maria e, erguendo o menino acima de suas cabeças, o beijavam, dizendo: "Feliz de tua mãe, ó Jesus, Salvador do mundo! Felizes os olhos que gozam da felicidade da tua presença".
As duas
irmãs disseram à mãe: "Nosso irmão retomou sua forma primitiva, graças à
intervenção do Senhor Jesus e aos bons conselhos desta jovem, que nos
sugeriu recorrer a Maria e ao seu filho. E agora, já que nosso irmão não
está casado, pensamos que seria conveniente que ele desposasse esta
moça." Após haverem feito este pedido a Maria e haver ela consentido,
fizeram para as bodas preparativos esplêndidos, e a dor transformou-se
em alegria e o choro cedeu espaço ao riso. Elas só fizeram cantar e
regozijar-se, enfeitadas com magníficas vestimentas e jóias preciosas.
Ao mesmo tempo, entoavam cânticos de louvor a Deus, dizendo: "O Jesus,
Filho de Deus, que transformaste nossa aflição em contentamento e nossas
lamúrias em gritos de alegria!" José e Maria lá permaneceram por dez
dias; ac partirem, receberam demonstrações de veneração de parte de toda
a família que despediu-se deles chorando muito, principalmente a moça,
que se desfazia em lágrimas.
Chegaram,
em seguida, um deserto, e como lhes haviam dito que era infestado de
ladrões, prepararam-se pare atravessá-lo durante a noite. E eis que de
repente avistaram dois ladrões que dormiam, E perto deles muitos outros
ladrões seus companheiros, que também estavam entregues ao sono. Estes
dois ladrões chamavam-se Tito e Dímaco. Ora o primeiro disse ao outro:
"Eu te peço que deixes estes viajantes irem em paz, para que nossos
companheiros não os vejam". Tendo Dímaco recusado Tito disse-lhe:
"Dou-te 40 dracmas e fica com o meu cinto como penhor". E deu-lhe cinto
e, ao mesmo tempo, pediu que não desse o alarme. Maria, vendo este
ladrão tão disposto a servi-los, disse-lhe "Que Deus te proteja com sua
mão direita e que ele te conceda a remissão de teus pecados'. E o Senhor
Jesus disse a Maria: "Daqui a 30 anos, ó minha mãe, os judeus me
crucificarão em Jerusalém, e estes dois ladrões serão postos na cruz a
meu lado, Tito à minha direita e Dímaco à minha esquerda, e neste dia
Tito me precederá no Paraíso". E quando ele assim falou, sua mãe
respondeu-lhe: "Que Deus afaste de ti semelhante desgraça, ó meu filho!"
E foram dar em seguida em uma cidade cheia de ídolos, e quando eles se
aproximavam, ela foi trans formada em um monte de areia.
Vieram ter,
em seguida, a um sicômoro, que chamam hoje de Mataréia, e o Senhor
Jesus fez surgir neste lugar uma fonte onde Maria lavou sua túnica. E o
bálsamo que produz este país vem do suor que escorreu pelos membros de
Jesus.
Foram então
a Mênfis, e tendo visitado o faraó, permaneceram três anos no Egito, e o
Senhor Jesus fez muitos milagres que não estão consignados nem no
Evangelho da Infância, nem no Evangelho Completo.
Depois de
três anos, eles deixaram o Egito e voltaram para a Judéia; mas quando já
estavam próximos, José teve medo de entrar lá porque acabara de saber
que Herodes estava morto e que seu filho Arquelau havia-lhe sucedido;
mas o anjo de Deus apareceu-lhe e disse-lhe: "O José, vai para a cidade
de Nazaré e estabelece ali tua residência".
Quando
chegaram a Belém, havia uma proliferação de doenças graves e difíceis de
serem curadas, que atacavam os olhos das crianças e lhes causava a
morte. E uma mulher que tinha um filho atacado por esse mal, levou-o a
Maria, e encontrou-a banhando o Senhor Jesus. E a mulher disse: "O
Maria, vê meu filho que sofre cruelmente". Maria, ouvindo-a, disse-lhe:
"Pega um pouco desta água com a qual eu lavei meu filho e espalha-a
sobre o teu". A mulher fez como lhe havia recomendado Maria, e seu
filho, depois de uma forte agitação, adormeceu e quando acordou, estava
completamente curado. A mulher, cheia de alegria, foi até Maria, que lhe
disse: "Rende graças a Deus por ele haver curado o teu filho".
Esta mulher
tinha uma vizinha cujo filho fora atingido pela mesma doença e cujos
olhos estavam quase fechados; ele gritava e chorava, noite e dia. E
aquela cujo filho havia sido curado disse-lhe: "Por que não levas teu
filho a Maria como eu fiz quando o meu estava prestes a morrer e ele foi
curado pela água do banho de Jesus?" E a mulher foi pegar também
daquela água, e assim que ela derramou sobre seu filho, ele foi curado.
Levou então seu filho em perfeita saúde para Maria, que lhe recomendou
que rendesse graças a Deus e que não contasse a ninguém o que havia
acontecido.
Havia na
mesma cidade duas mulheres casadas com um mesmo homem, e cada uma delas
tinha um filho doente. Uma se chamava Maria e seu filho, Cleofás. Esta
mulher levou seu filho a Maria, mãe de Jesus, e ofereceu-lhe uma bela
toalha, dizendo-lhe: "á Maria, recebe de mim esta toalha e, em troca,
dá-me uma das tuas fraldas". Maria consentiu e a mãe de Cleofás
confeccionou, com esta fralda, uma túnica, com a qual vestiu seu filho. E
ele ficou curado e o filho de sua rival morreu no mesmo dia, o que
causou profundos ressentimentos entre estas duas mulheres. Elas se
encarregavam, em semanas alternadas, dos trabalhos caseiros, e um dia em
que era a vez de Maria, a mãe de Cleofás, ela estava ocupada aquecendo o
forno para assar o pão, e precisando de farinha, deixou seu filho perto
do forno. Sua rival, vendo que a criança estava sozinha, pegou-a e
jogou-a no forno em brasa e fugiu. Maria retornou logo em seguida, mas
qual não foi o seu espanto quando ela viu seu filho no meio do forno,
rindo, pois ele havia subitamente esfriado, como se jamais houvesse sido
aquecido, e ela suspeitou que sua rival o havia jogado ali. Tirou-o de
lá e levou-o até a Virgem Maria, e contou-lhe o que havia acontecido. E
Maria disse-lhe: "Cala-te, pois eu receio por ti se divulgares tais
coisas".
Em seguida,
a rival foi buscar água no poço, e vendo Cleofás brincando, e vendo que
não havia ninguém por perto, pegou a criança e jogou-a no poço. Alguns
homens que haviam vindo para tirar água viram a criança sentada na água,
sem nenhum ferimento, e por meio de cordas, tiraram-na de lá. E ficaram
tão admirados com esta criança que renderam-lhe as mesmas homenagens
devidas a um Deus. E sua mãe, chorando, carregou-o até Maria e
disse-lhe: "O minha senhora, vê o que minha rival fez ao meu filho, e
como ela o fez cair no poço. Ah! ela acabará, por certo, causando-lhe a
morte." Maria respondeu-lhe: "Deus punirá o mal que te foi feito".
Alguns dias depois, a rival foi buscar água no poço e seus pés
enroscaram-se na corda, de modo que ela caiu nele, e quando acorreram,
acharam-na com a cabeça partida. Ela morreu, portanto, de uma forma
funesta; a palavra do sábio se cumpre em si: "Cavaram um poço e jogaram a
terra em cima, mas caíram no poço que eles mesmos haviam preparado".
Uma outra
mulher da mesma cidade tinha dois filhos, os dois doentes; um morreu e o
outro estava agonizando; sua mãe tomou-o nos braços e levou-o até
Maria, e aos prantos, disse-lhe: "ó minha senhora, vem em meu auxílio e
tem piedade de mim; eu tinha dois filhos e acabo de perder um, e vejo o
outro a ponto de morrer. Imploro a misericórdia do Senhor". E pos-se a
gritar: "Senhor, tu és pleno em clemência e compaixão; tu me deste dois
filhos, me levaste um deles, pelo menos deixa-me o outro." Maria,
testemunha de sua extrema dor, sentiu pena e disse-lhe: "Coloca teu
filho na cama de meu filho e cobre-o com suas roupas". E quando a
criança foi colocada na cama ao lado de Jesus, seus olhos já cerrados
pela morte abriram-se, e chamando sua mãe em voz alta, pediu-lhe pão, e
quando lhe deram, comeu-o. Então sua mãe disse: "ó Maria, eu sei que a
virtude de Deus habita em ti, a ponto de teu filho curar as crianças que
o tocam." E a criança que assim foi curada é o mesmo Bartolomeu de quem
se fala no Evangelho.
Havia ainda
no mesmo lugar uma leprosa que foi ter com Maria, mãe de Jesus,
dizendo-lhe: "ó minha senhora, tem piedade de mim". E Maria
respondeu-lhe: "Que ajuda pedes tu? Queres ouro, prata ou queres te
curar da lepra?" A mulher respondeu: "Que podes fazer por mim?" E Maria
disse: "Espera um pouco até que eu tenha banhado e posto meu filho na
cama". A mulher esperou e Maria, após o haver deitado, estendeu à mulher
um vaso cheio da água do banho de seu filho e disse-lhe: "Pega um pouco
desta água e espalha-a sobre o teu corpo". E assim que a doente
obedeceu, curou-se e ela rendeu graças a Deus.
Ela partiu
em seguida, após haver permanecido três dias junto de Maria, e foi para
uma cidade onde morava um príncipe que havia desposado a filha de um
outro príncipe; mas, quando ele viu sua esposa, percebeu entre seus
olhos as marcas da lepra sob a forma de uma estrela, e o seu casamento
foi declarado nulo e não válido.
E esta
mulher vendo o desespero da princesa, perguntou-lhe a causa destas
lágrimas, e a princesa respondeu-lhe: "Não me interrogues, pois a minha
desgraça é tanta que eu não posso revelá-la a ninguém." A mulher ouvindo
a voz desta infeliz, subiu até o telhado de seu castelo e viu-a com as
mãos unidas acima da cabeça, a verter copiosas lágrimas, e todos aqueles
que a rodeavam estavam desolados. E ela perguntou se a mãe desta
possuída vivia ainda. E quando lhe responderam que o seu pai e sua mãe
estavam ambos vivos, ela disse: "Tragam sua mãe até mim." E quando
chegou, ela perguntou-lhe: "E a tua filha que está assim possuída?" E a
mãe tendo respondido que sim, chorando, a princesa disse: "Não revela o
que vou te contar; eu já fui uma leprosa, mas Maria, a mãe de Jesus
Cristo, me curou. Se queres que tua filha tenha a mesma felicidade,
leva-a a Belém e implora com fé a ajuda de Maria, e eu creio que
voltarás cheia de alegria, trazendo tua filha curada." Imediatamente a
mãe levantou-se e partiu; foi procurar Maria e expôs-lhe o estado de sua
filha. Maria, após tê-la ouvido, deu-lhe um pouco da água na qual ela
havia lavado seu filho Jesus, e disse-lhe para derramá-la sobre o corpo
da possuída. Em seguida deu-lhe uma fralda do menino Jesus e disse-lhe:
"Pega isto e mostra-o a teu inimigo, todas as vezes que o vir", e
despediu-as com suas bênçãos.
Quando,
após haver deixado Maria, elas retornaram à sua cidade, e quando veio o
tempo no qual Satanás costumava atormentá-la, ele apareceu-lhe sob a
forma de um grande dragão; ao ver a sua aparência, a jovem foi tomada
pelo pavor, mas sua mãe disse-lhe: "Não temas, minha filha, deixa que
ele se aproxime mais de ti e mostra-lhe esta fralda que nos deu Maria, e
veremos o que ele poderá fazer." E quando o espírito maligno, que havia
tomado a forma de um dragão, estava bem perto, a doente, tremendo de
medo, colocou sobre sua cabeça a fralda e desdobrou-a, e de repente,
dela saíram chamas que se dirigiam à cabeça e aos olhos do dragão, e
ouviu-se uma voz que gritava: "Que há entre ti e mim, ó Jesus, filho de
Maria? Onde encontrarei um abrigo que me livre de ti. E Satanás fugiu
apavorado, abandonando esta jovem, é nunca mais apareceu. E ela viu-se
assim curada e, grata, rendeu graças a Deus, assim como todos os que
haviam presenciado este milagre.
Havia nesta
mesma cidade uma outra mulher cujo filho era atormentado por Satanás.
Ele se chamava Judas, e sempre que o espírito maligno apoderava-se dele,
ele tentava morder todos os que estavam à sua volta e, se estivesse
sozinho, mordia suas próprias mãos e membros. A mãe deste infeliz,
ouvindo falar de Maria e de seu filho Jesus, foi com seu filho nos
braços até Maria. Nesse meio tempo, Tiago e José haviam trazido o menino
Jesus para fora da casa, para que ele pudesse brincar com as outras
crianças, e eles estavam sentados fora da casa e Jesus com eles. Judas
aproximou-se também e sentou-se à direita de Jesus, e quando Satanás
começou a agitá-lo como sempre o fazia, ele tentou morder Jesus, e como
ele não podia alcançá-lo, dava-lhe socos no lado direito, de forma que
Jesus começou a chorar. Mas, neste momento, Satanás saiu desta criança
sob a forma de um cão enraivecido. E esta criança era Judas Iscariotes
que traiu Jesus, e o lado em que ele havia batido foi aquele que os
judeus trespassaram com a lança.
Quando o
Senhor Jesus havia completado o seu sétimo ano, ele brincava um dia com
outras crianças de sua idade; para divertir-se, eles faziam com terra
molhada diversas imagens de animais, de lobos, de asnos, de pássaros, e
cada um elogiando seu próprio trabalho, esforçando-se para que fosse
melhor que o de seus companheiros. Então o Senhor Jesus disse para as
crianças: "Ordenarei às figuras que eu fiz que andem e elas andarão." E
as crianças lhe perguntaram se ele era o filho do Criador, e o Senhor
Jesus ordenou às imagens que andassem e elas imediatamente andaram.
Quando ele mandava voltar, elas voltavam. Ele havia feito figuras de
pássaros que voavam quando ele ordenava que voassem e que paravam quando
ele dizia para parar, e quando ele lhes dava bebida e comida, eles
comiam e bebiam. Quando as crianças foram embora e contaram aos seus
pais o que haviam visto, eles disseram: "Fuji, daqui em diante, de sua
companhia, pois ele é um feiticeiro, deixai de brincar com ele."
Um certo
dia em que brincava e corria com outras crianças, o Senhor Jesus passou
em frente à loja de um tintureiro que se chamava Salém. Havia nesta loja
tecidos que pertenciam a um grande número de habitantes da cidade, e
que Salém se preparava para tingir de várias cores. Tendo Jesus entrado
na loja, pegou todas as fazendas e jogou-as na caldeira.
Salém
virou-se e vendo todas as fazendas perdidas, pôs-se a gritar e a
repreender Jesus, dizendo: "Que fizeste tu, ó filho de Maria?
Prejudicaste a mim e a meus concidadãos; cada um pediu uma cor
diferente, e tu apareceste e puseste tudo a perder." O Senhor Jesus
respondeu: "Qualquer fazenda que queiras mudar a cor, eu mudo." E ele se
pôs a retirar as fazendas da caldeira, e cada uma estava tingida da cor
que desejava o tintureiro. E os judeus, testemunhas deste milagre,
celebraram o poder de Deus.
José ia por
toda a cidade levando com ele o Senhor Jesus, e chamavam-no para que
fizesse portas, arcas e catres, e o Senhor Jesus estava sempre com ele. E
sempre que a obra de José precisava ser mais comprida ou mais curta,
mais larga ou mais estreita, o Senhor Jesus estendia a mão, e ela ficava
exatamente do jeito que queria José, de forma que ele não precisava
retocar nada com sua própria mão, pois ele não era muito hábil no ofício
de marceneiro.
Um dia, o
rei de Jerusalém mandou chamá-lo e disse: "Eu quero, José, que me faças
um trono segundo as dimensões do lugar onde costumo sentar-me." José
obedeceu, e pondo mãos à obra, passou dois anos no palácio para elaborar
este trono. E quando ele foi colocado no lugar onde deveria ficar,
perceberam que de cada lado faltavam dois palmos à medida fixada. Então o
rei ficou bravo com José, que temendo a raiva do monarca, não conseguiu
comer e deitou-se em jejum. Então, o Senhor Jesus perguntou-lhe qual
era a causa do seu receio, e ele respondeu: "E: que a obra na qual
trabalhei durante dois anos está perdida." E o Senhor Jesus
respondeu-lhe: "Não tenhas medo e não percas a coragem; pega este lado
do trono e eu o outro, para que possamos dar-lhe a medida exata." E José
tendo feito o que lhe havia pedido o Senhor Jesus, e cada um puxando
para um lado, o trono obedeceu e ficou exatamente com a dimensão
desejada. Os assistentes, vendo este milagre, ficaram estupefatos e
deram graças a Deus. Este trono fora feito com uma madeira do tempo de
Salomão, filho de Davi, e que era notável por seus nós que representavam
várias formas e figuras.
Um outro
dia, o Senhor Jesus foi até a praça, e vendo as crianças que se haviam
reunido para brincar, juntou-se a elas; mas estas, tendo-o visto,
esconderam-se, e o Senhor Jesus foi até uma casa e perguntou às mulheres
que estavam à porta onde as crianças haviam ido. E como elas
responderam que não havia nenhuma delas na casa, o Senhor Jesus
disse-lhes: "Que vocês estão vendo sob este arco?" Elas responderam que
eram carneiros com três anos de idade, e o Senhor Jesus gritou: "Saí,
carneiros, e vinde em direção ao vosso pastor." E imediatamente as
crianças saíram, transformadas em carneiros, e eles saltavam ao seu
redor, e estas mulheres tendo visto isto, foram tomadas de pavor. E elas
adoraram o Senhor Jesus, dizendo: "ó Jesus, filho de Maria, nosso
Senhor, tu és verdadeiramente o bom Pastor de Israel; tem piedade de
tuas servas que estão em tua presença e que não duvidam, Senhor, que tu
vieste para curar, e não para perder." Em seguida, o Senhor tendo
respondido que as crianças de Israel estavam entre os povos como os
Etíopes, as mulheres disseram: "Senhor, conheces as coisas, e nada
escapa à tua infinita sabedoria; pedimos e esperamos a tua misericórdia,
que devolvas a estas crianças sua antiga forma." E o Senhor Jesus disse
então: "Vinde, crianças, para que possamos brincar." E imediatamente,
na presença das mulheres, os carneiros retomaram a aparência de
crianças.
No mês de
Adar, Jesus reuniu as crianças e colocou-se como o seu rei: elas haviam
estendido suas roupas no chão para fazê-lo sentar-se sobre elas, e elas
haviam colocado sobre sua cabeça uma coroa de flores, e, como os
satélites que acompanham um rei, elas se haviam enfileirado à sua
direita e à sua esquerda. Se alguém passava por lá, as crianças faziam
parar à força e diziam-lhe: "Vem e adora o rei, para que obtenhas uma
feliz viagem."
Nisto,
chegaram alguns homens que carregavam uma criança em uma liteira. Este
menino havia ido até a montanha com seus colegas para apanhar lenha, e,
tendo encontrado um ninho de perdiz, pôs a mão para retirar os ovos, mas
uma serpente escondida no ninho mordeu-o, e ele chamou seus
companheiros para socorrê-lo. Mas quando chegaram, eles o encontraram
estendido no chão e quase morto; então alguns familiares vieram e
levaram-no à cidade. Quando chegaram ao local onde o Senhor Jesus estava
sentado em seu trono como um rei, com outras crianças à sua volta, como
sua corte, estas foram ao encontro dos que carregavam o moribundo e
disseram-lhes: "Vinde e saudai o rei." Como eles não queriam
aproximar-se por causa da tristeza que sentiam, as crianças traziam-nas à
força. E quando estavam na frente do Senhor Jesus, ele perguntou-lhes
por que estavam carregando aquela criança; responderam que uma serpente a
havia mordido, e o Senhor Jesus disse às crianças: "Vamos juntos e
matemos a serpente." Os pais da criança que estava prestes a morrer
suplicaram para que os deixassem ficar, mas elas responderam: "Não
ouvistes o que o rei disse: 'Vamos e matemos a serpente', e não
deveríeis seguir suas ordens?" E apesar da sua oposição eles retornaram à
montanha, carregando a liteira. Quando chegaram perto do ninho, o
Senhor Jesus disse às crianças: "Não é aqui que se esconde a serpente?" E
eles responderam que sim, e a serpente, chamada pelo Senhor Jesus, saiu
e submeteu-se a ele. E o Senhor lhe disse: "Vai e suga todo o veneno
que espalhaste nas veias desta criança." A serpente, arrastando-se,
sugou todo o veneno que ela havia inoculado, e o Senhor em seguida
amaldiçoou-a e, fulminada, morreu logo em seguida. E o Senhor Jesus
tocou a criança com sua mão, e ela foi curada. E como ela se pusesse a
chorar, o Senhor Jesus lhe disse: "Não chores, serás meu discípulo." E
esta criança foi Simão de Cananéia, de quem se faz menção no Evangelho.
Maria havia
mandado um dia o Senhor Jesus tirar água do poço. E quando ele havia
cumprido a tarefa e colocava sobre a cabeça o cântaro cheio, ele
partiu-se. E o Senhor Jesus tendo estendido o seu manto, levou para sua
mãe a água recolhida, e ela admirou-se e guardou em seu coração tudo o
que havia visto.
Um outro
dia, o Senhor Jesus brincava na beira do rio com outras crianças, e eles
haviam cavado pequenas valas para fazer escorrer a água, formando assim
pequenas poças. O Senhor Jesus havia feito doze passarinhos de barro, e
os havia colocado ao redor da água, três de cada lado. Era um dia de
Sábado, e O filho de Hanon, o Judeu, veio e vendo-os assim entretidos,
disse-lhes: "Como podeis em um dia de Sábado fazer figuras com a lama?" E
ele se pôs a destruir tudo. E quando o Senhor Jesus estendeu as mãos
sobre os pássaros que havia moldado, eles saíram voando e cantando. Em
seguida, o filho de Hanon, o Judeu, aproximou-se da poça cavada por
Jesus para destruí-la mas a água desapareceu, e o Senhor Jesus
disse-lhe: "Vê como esta água secou; assim será com a tua vida." E a
criança secou.
Um outro
dia, o Senhor Jesus voltava à noite para casa com José, quando uma
criança passou correndo na sua frente e deu-lhe um golpe tão violento
que o Senhor Jesus quase caiu, e ele disse a esta criança: "Assim como
tu me empurraste, cai e não te levantes mais." E no mesmo instante, a
criança caiu no chão e morreu.
Havia em
Jerusalém um homem, chamado Zaqueu, que instruía os jovens. E ele dizia a
José: "José, por que não me envias Jesus para que ele aprenda as
letras?" José concordou e também Maria. Levaram pois a criança para o
professor, e assim que ele o viu, escreveu o alfabeto e pediu-lhe que
pronunciasse Aleph. E quando ele o fez, pediu-lhe para dizer Beth. O
Senhor Jesus disse-lhe: "Dize-me primeiro o que significa o Aleph, e aí
então eu pronunciarei Beth." E o professor preparava-se para
chicoteá-lo, mas o Senhor Jesus pôs-se a explicar o significado das
letras Aleph e Beth, quais as letras de linhas retas, quais as oblíquas,
e as que tinham desenho duplo, as que tinham pontos, aquelas que não
tinham e porque tal letra vinha antes da outra, enfim, ele disse muitas
coisas que o professor jamais ouvira e que não havia lido em livro
algum. E o Senhor Jesus disse ao professor: "Presta atenção ao que vou
dizer." E ele pôs-se a recitar clara e distintamente Aleph, Beth,
Ghimel, Daleth, até o fim do alfabeto. O mestre ficou admirado e disse:
"Creio que esta criança nasceu antes de Noé"; e virando-se para José,
acrescentou: "Tu o conduziste para que eu o instruísse, uma criança que
sabe mais que todos os doutores." E ele disse a Maria: "Teu filho não
precisa de nossos ensinamentos."
Conduz
iram-no em seguida a um professor mais sábio, e assim que o viu: "Dize
Aleph", pediu-lhe ele. E quando ele disse Aleph, o professor pediu-lhe
que pronunciasse Beth. E o Senhor Jesus respondeu-lhe: "Dize-me o que
significa a letra Aleph, e então eu pronunciarei Beth." O mestre
irritado levantou a mão para bater nele, mas sua mão secou
instantaneamente, e ele morreu. Então José disse a Maria: "Daqui por
diante, não devemos mais deixar o menino sair de casa, pois qualquer um
que se oponha a ele é fulminado pela morte."
Quando
contava doze anos de idade, levaram Jesus a Jerusalém por ocasião da
festa, e quando ela terminou, eles voltaram; mas o Senhor Jesus
permaneceu no templo, em meio aos doutores e aos velhos e aos sábios dos
filhos de Israel, que ele interrogava sobre diferentes pontos da
ciência, mas também respondia-lhes as perguntas. Jesus perguntou-lhes:
"De quem é filho o Messias?" E eles responderam: "Este é filho de Davi."
Jesus respondeu: "Por que então Davi, movido pelo Espírito Santo,
chama-o Senhor, quando diz: 'O Senhor disse ao meu Senhor: `Senta-te à
minha direita para que eu coloque teus inimigos aos teus pés'?" Então um
importante rabino interrogou-o, dizendo: "Leste os livros sagrados?" O
Senhor Jesus respondeu: "Eu li os livros e o que eles contêm", e ele
explicava-lhes as Escrituras, a lei, os preceitos, os estatutos, os
mistérios que estão contidos nos livros das profecias, e que a
inteligência de nenhuma criatura pode compreender. E o principal entre
os doutores disse: "Eu jamais vi ou ouvi tamanha instrução; quem credes
que seja esta criança?"
Havia lá um
filósofo, astrônomo sábio, que perguntou ao Senhor Jesus se ele havia
estudado a ciência dos astros. E Jesus respondendo-lhe, expôs o número
de esferas e de corpos celestes, sua natureza e sua oposição, seu
aspecto trinário, quaternário e sêxtil, sua progressão e seu movimento
de leste para oeste, o cômputo e o prognóstico e outras coisas que a
razão de nenhum homem escrutou.
Havia
também entre eles um filósofo muito sábio em medicina e ciências
naturais, e quando ele perguntou ao Senhor Jesus se ele havia estudado a
medicina, este expôs-lhe a física, a metafísica, a hiperfisica e a
hipofisica, as virtudes do corpo e os humores e os seus efeitos, o
número de membros e de ossos, de secreções, de artérias e de nervos, as
temperaturas, calor e seco, frio e úmido, e quais as suas influências;
quais as atuações da alma no corpo, suas sensações e suas virtudes, a
faculdade da palavra, da raiva, do desejo, sua composição e dissolução e
outras coisas que a inteligência de nenhuma criatura jamais alcançou.
Então o filósofo ergueu-se e adorou o Senhor Jesus, dizendo: "Senhor,
daqui em diante serei teu discípulo e teu servo."
E enquanto
assim falavam, Maria apareceu junto com José, e fazia três dias que
procuravam por Jesus; vendo-o sentado entre os doutores, interrogando-os
e respondendo-lhe alternadamente, ela lhe disse: "Meu filho, por que
agiste assim conosco? Teu pai e eu te procuramos, e tua ausência
causou-nos muita aflição." Ele respondeu: "Por que me procuráveis? Não
sabíeis que convinha que eu permanecesse na casa de meu Pai?" Mas eles
não entendiam as palavras que ele lhes dirigia. Então os doutores
perguntaram a Maria se ele era seu filho, e ela tendo respondido que
sim, eles exclamaram: "O feliz Maria, que deste à luz tal criança." Ele
voltou com os pais para Nazaré, e ele lhes era submisso em tudo. E sua
mãe conservava todas as suas palavras em seu coração. E o Senhor Jesus
crescia em tamanho, em sabedoria e em graça diante de Deus e diante dos
homens.
Ele começou
desde esse dia a esconder os seus segredos e seus mistérios, até que
completou trinta anos, quando seu Pai, revelando publicamente sua missão
às margens do Jordão, fez soar, do alto do céu, estas palavras: "E meu
filho Amado no qual coloquei toda minha complacência", e foi quando o
Espírito Santo apareceu sob a forma de uma pomba branca.
E a ele que
humildemente adoramos, pois ele nos deu a existência e a vida, e ele
nos fez sair das entranhas de nossas mães; ele tomou, por nós, o corpo
de homem, e ele nos redimiu, cobrindo-nos com sua misericórdia eterna e
concedendo-nos a graça do seu amor e de sua bondade. A ele portanto,
glória, poder, louvores e domínio por todos os séculos. Que assim seja.
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