CAMOCIM CEARÁ

Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra; Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos; Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia; Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus; Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus; Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus; Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa.(Mt.5)

terça-feira, 13 de novembro de 2012

BASTARDO DE AVELAR SANTOS


Foto: Francilúcio Oliveira
BASTARDO

Camocim fica encravada no litoral oeste da Terra da Luz - e é considerada como um dos maiores portos de vela do mundo.
Das muitas embarcações típicas do Ceará aqui existentes, cantadas altivamente em verso e prosa por nossos grandes poetas e romancistas, as canoas e as jangadas, postadas a perder de vista por toda orla marítima camocinense, talvez pela singeleza estética de seus finos traços, encantam os olhos e aquietam a alma, até mesmo àquela mais doída e angustiada. Uma embarcação, entretanto, se sobressai, altaneira, dentre as demais, por sua beleza inigualável e porte real, cujo nome exótico não saberia explicar corretamente a sua origem. Falo do Bastardo, uma embarcação de madeira de aproximadamente vinte metros de comprimento, com uma única vela triangular gigantesca, que capta com sobriedade incomum a força do vento, fazendo-o navegar veloz e garbosamente, qual um cisne branco em um lago sereno. Voltado para a pescaria em alto mar, o barco consegue armazenar quase sete toneladas de pescado, possuindo, via de regra, uma tripulação de seis homens, podendo passar até vinte e cinco dias longe da terra.
Do abençoado mar cearense, de tantas e saborosas iguarias que atiçam o paladar daqueles que nos visitam, o Bastardo traz, nos seus imensos porões, peixes nobres deliciosos, tais como: ariacó, cioba, carapitanga, pargo e robalo. Quando ele vem “chapado” de pescado, como vulgarmente costumamos dizer, navegando com a quilha levantada, quase à flor da água, de tanto peso, somente consegue adentrar a barra na maré cheia, fazendo muito esforço para atingir as águas calmas da baía, aonde costuma ancorar, ali, nas proximidades da Pedra do Mero. Acontece que com os passar dos anos, e com o contínuo descaso das autoridades de plantão, o canal principal de navegação sofreu um grande desgaste, em termos de assoreamento, provocado sobretudo pela areia fina mutante, advinda sabe-se lá de onde, que diariamente o invade – e gradativamente vai soterrando-o à exaustão.
Quantas vezes, bom Deus, no decorrer de quase meia eternidade, ao amanhecer e ao entardecer, vi-me debruçado no velho balaústre de minha amada cidade, com os olhos fixos no mar, feito criança, admirando a paisagem belíssima que Deus nos presenteou, de forma única e generosa, a observar o vai e vem encantador - e incessante - das inúmeras embarcações que demandam cotidiana e religiosamente ao Rio da Cruz.
Sem nos darmos conta, após algum tempo de contemplação desta procissão solene, que tem como pano de fundo a Ilha da Testa Branca, uma sensação indizível de bem-estar - e de paz - começa a invadir o mais íntimo de nosso ser, extasiando-nos por completo, levando-nos, arrebatadoramente, a um encontro inefável com o Criador. E, se neste cortejo sublime e silencioso, o Bastardo estiver principescamente galopando as ondas, há indiscutivelmente uma abertura momentânea do portal que nos separa da Divindade, permitindo a nós, míseros mortais, alçarmos nosso espírito à união indissolúvel com o Todo Poderoso, algo que indubitavelmente tanto almejamos.
As velas de Camocim são únicas! Nada mais belo existe!
E o Bastardo, neste contexto grandioso, evidentemente é filho legítimo da nobre arte da navegação cabeça chata, cujos protagonistas maiores são os nossos valorosos, talentosos e intrépidos pescadores!


AVELAR SANTOS

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